GESTÃO COM AS PESSOAS: o enfrentamento dos desafios da Pandemia
Por Carla Cristina Dutra Búrigo
A humanidade, vem vivendo um momento peculiar, historicamente inimaginável. Precisamos nos reinventar, para sobreviver. Precisamos nos isolar fisicamente, para sobreviver. Precisamos nos unir, mesmo que distante, para sobreviver.
A pandemia, nos trouxe, quiçá uma consciência planetária, de algum modo democrática, que o isolamento social é a melhor maneira de sermos solidários com a preservação das nossas vidas e com a vida dos outros. Isolarmos uns dos outros, sem sequer nos tocarmos. É a normalidade da exceção. Da nossa exceção social.
Como reflexo da sociedade, a instituição universidade, por meio do seu processo de gestão vem necessitando se repensar, se reinventar em todos os sentidos, para manter suas atividades essenciais do ensino, da pesquisa e da extensão. E isto, concretamente só está sendo possível, mesmo que distante, por meio da gestão com as pessoas, mediante a um processo de reflexão além do historicamente instituído.
A universidade como instituição social, inserida na sociedade, vivencia uma relação contraditória, de legitimadora e opositora a sociedade, devido a essência pedagógica, acadêmica e social, da qual é constitutiva.
A universidade em todo o seu processo histórico, vivenciou inúmeras crises de identidade na sua relação com a sociedade. Em pleno Século XXI, como elemento central de constituição do sistema da educação superior, a instituição universidade, está representada em todos os países do mundo e vive, ao longo do seu processo de consolidação, momentos turbulentos de formação e transformação, pois é uma expressão social, que exprime o modo de funcionamento da sociedade.
Nos primórdios, a universidade como instituição social, sob a proteção da Igreja, no Mundo Ocidental, tinha o objetivo de formar clérigos. Isto ocorreu no Século XIII, considerado como o Século do Apogeu das Universidades. Como um centro de formação cultural, com base nos entendimentos da sociedade da época, a universidade sofre sua primeira crise de identidade com o advento do Renascimento. Há uma ruptura nos valores sociais da época, e um novo fenômeno surge, o Estado, como um poder a priori, considerado laico, diante dos ditames ideológicos de preservação dos valores cristãos.
A universidade se legitima no contexto da própria sociedade, pois, como uma instituição dinâmica, sobrevive até nossos dias com ares de perenidade, apesar das crises passageiras ou prolongadas que a levaram até a sua supressão por um período de doze anos, como foi o caso da França. Por outro lado, diante de todo o processo do seu desenvolvimento histórico, esta incessante busca de perenidade da universidade, por si só, mostra o seu valor como uma instituição social. É um marco enraizado na sociedade, acompanhando o seu tempo, interagindo e sofrendo as influências dos fenômenos sociais, políticos e econômicos que a constituem.
Com a Pandemia, a gestão universitária, necessitou rever suas ações, preservando vidas e as mantendo funcionalmente, no contexto de potencializar o trabalhador. Trabalhador, que precisou se organizar na vida privada, na sociedade e no trabalho. Fazer a gestão, potencializando as pessoas. Foi sem dúvida, um dos maiores desafios, diante de um cenário social frágil e desafiador.
Acordamos um dia, precisando pensar e agir diferente, na intencionalidade de manter uma instituição como a universidade, atuante em suas ações. Muitas vezes, com alto níveis de esforços individuais, incalculáveis. Privações familiares, dificuldades privadas, que necessitaram ser reorganizadas, repensadas diante de um compromisso coletivo de manter viva e pungente as ações da universidade.
A gestão, foi o alicerce para a manutenção e reinvenção da Universidade neste período pandêmico. A gestão não parou sequer um dia, como uma ação perene de sobrevivência da própria universidade. A palavra gestão, tem sua raiz etimológica em gerir, que significa fazer brotar, germinar, fazer nascer (CURY, 2006).1 Nesta perspectiva, a gestão universitária, precisou essencialmente potencializar as pessoas, como sujeito de suas ações em um cenário por nós totalmente desconhecido. Buscamos e estamos materializando os pressupostos da gestão colaborativa, colegiada, que se sustenta no gerenciar com as pessoas.
Como uma instituição social, no processo da gestão também vivenciamos um contraditório e antagónico fluxo de sentimentos. Estamos vivendo a “normalidade da exceção”, nos diz Boaventura de Sousa Santos (2020)2. Precisamos nos isolar fisicamente para sobreviver, e ao mesmo tempo nos unir mesmo que distante, para vencer o desafio de sobreviver.
A etimologia da palavra Pandemia, quer dizer todo o povo. Por outro lado, há uma conjuntura econômica, política e social, que se revela e nos mostra que esta pandemia não é cega. A fragilidade humana, a nossa impotência se revela, se materializa, diante de algo invisível aos olhos, como também a nossa capacidade de superação.
Estamos superando a cada dia. Buscando mecanismos para nossa sobrevivência, e no âmbito universitário, para a sobrevivência desta instituição milenar chamada universidade. Historicamente, nos reinventamos, graças a potencialidade de cada trabalhador que luta pela gestão de uma universidade pública e publicizada em suas ações.
A gestão com as pessoas, o ouvir a experiência das pessoas, o reinventar o nosso normal, o fazer brotar o novo, o inesperado. Seguramente, o enfrentamento da pandemia, está sendo possível, a partir do sentimento de identidade, pertencimento e comprometimento das pessoas, no gerenciamento das ações da gestão. Gestar, fazer brotar novos caminhos com as pessoas, é o caminho que potencialmente encontramos para potencializar o processo da gestão universitária. Dando vida e vitalidade a missão da Universidade.
1 – CURY, Carlos Roberto Jamil. O direito à educação: um campo de atuação do gestor educacional na escola. 2006. Disponível em: http://escoladegestores.mec.gov.br/site/8- biblioteca/pdf/jamilcury.pdf.
2 – SANTOS, Boaventura de Sousa. A cruel pedagogia do vírus. Coimbra: Almedina, 2020.
*Carla Cristina Dutra Búrigo: Graduada em Pedagogia/UFSC (1986); Mestrado em Administração/UFSC (1997); Doutorado em Educação/ UFRGS (2003); e Pós-Doutorado em Educação/UFRGS (2009). Pedagogo (UFSC) e Professor Permanente do Programa de Pós-Graduação em Gestão Universitária (UFSC). Tem experiência na área de Educação e Gestão Universitária, com ênfase em Educação e Trabalho. Atualmente ocupa a Função de Pró-Reitora de Desenvolvimento e Gestão de Pessoas (UFSC).
Este artigo é de responsabilidade da autora e não reflete necessariamente a visão do INPEAU